Periperi

De acordo com os dados dos infográficos presentes neste site, em 2010, o bairro Periperi contava com uma população total de 47.179 habitantes, a maior parte se autodeclarou parda (54,47%) e preta (30,96%), do sexo feminino (52,96%) e se encontrava na faixa etária de 20 a 49 anos (50,96%). No que diz respeito aos domicílios, 0,85% dos responsáveis não eram alfabetizados e apesar de 40,5% estar na faixa de 0 a 1 salário mínimo, a renda média dos responsáveis por domicílio no bairro era de R$1.071. Já com relação a infraestrutura ofertada, 96,08% dos domicílios contavam com coleta de lixo, 98,17% com abastecimento de água e 87,81% com esgotamento sanitário.

 

Histórico

Texto de Jonas Oliveira Santana* e Mayara Mychella Sena Araújo**

Publicado em 05 de julho de 2021

 

Periperi é um dos bairros que compõem o Subúrbio Ferroviário de Salvador e tem suas origens ligada a uma antiga aldeia indígena, habitada pelos tupinambás e que se localizava na área correspondente ao atual bairro. Sendo esses povos, os responsáveis por nomear à área como Periperi, que vem da grafia indígena peripery, piripiri ou piri-piri, que significa capim-capim ou capinzal (BARRETO, 2011).

A partir de 1853, a área da então aldeia indígena passou por grandes mudanças com a autorização do governo imperial para a construção de uma linha férrea1, que ligaria a Cidade da Bahia, como comumente se referiam a Salvador na época, com a Vila Juazeiro. As obras da estrada de ferro se iniciam no ano seguinte, 1854, e o seu primeiro trecho que ia da Calçada a Paripe, foi inaugurado em 1860, constituindo a primeira ferrovia baiana e se consolidando como um dos principais formadores dos núcleos residenciais de Periperi (BARRETO, 2011; ARAÚJO, 2005). 

O processo de ocupação do bairro é intensificado com a instalação da linha férrea, permitindo, inclusive que Silva e Fonseca (1992) afirmem, que a partir dessa e com a instalação, em 1920, de uma oficina ferroviária2 na área, surgissem diversos núcleos populacionais. Esses núcleos eram compostos basicamente por operários ligados ou a linha férrea ou a oficina, que passaram a residir em casas localizadas no sentido linear da estrada de ferro, dando origem a primeira rua paralela a ela e nomeada como Rua 1º de Setembro ou Rua da Estação (SILVA; FONSECA, 1992).

Nessa época, todas essas terras ainda eram de propriedade de uma única família, a tradicional família Visco, que era dona de boa parte da área onde hoje se localiza o bairro, além de casas e lotes destinados a aluguel (BARRETO, 2011). Com isso, foi formada uma relação de vinculação entre a classe operária e os proprietários de terras, conforme alugavam as casas ou os pequenos lotes direcionados ao trabalho, instalando, através desse processo um espaço urbano, mesmo que incipiente e insalubre (SILVA; FONSECA, 1992).

Nesse mesmo período, na área correspondente ao bairro ainda era possível notar valas de águas transparentes e diversos riachos que cortavam os caminhos, além de alguns afluentes do rio Paraguari, pertencente à Bacia Hidrográfica de mesmo nome (BARRETO, 2011). 

Com a concentração de pessoas, principalmente de classes sociais mais vulneráveis, juntamente com a presença dos latifundiários, das indústrias e com a ascensão dos pequenos comerciantes, aumentaram as pressões junto ao Estado em busca de melhorias na infraestrutura e criação de serviços para atender ao bairro. Devido às diversas reivindicações, os pedidos começaram a ser atendidos com a instalação de postos médicos, modernização do sistema metroviário, que a partir de 1938, passou a ser eletrificado (SILVA; FONSECA, 1992).

Em 1939, Periperi continua a se desenvolver como um bairro residencial com a construção de diversas residências, direcionadas principalmente aos funcionários da então Viação Férrea Federal Leste Brasileiro (BARRETO, 2011). O bairro passa a apresentar um considerável crescimento demográfico, havendo a necessidade de intervenção urbanística por parte da Prefeitura Municipal de Salvador (PMS), que altera o traçado das ruas e as coloca sempre em paralelo à Rua da Estação, intervindo também no seu aspecto habitacional (SILVA; FONSECA, 1992). 

A partir de 1944, devido seu caráter bucólico, Periperi se tornou o endereço das casas de veraneio das famílias mais abastadas e tradicionais de Salvador, dentre esses veranistas, o escritor Jorge Amado, que além de manter uma casa no bairro, também o escolheu como o local onde o protagonista do seu livro, “Os velhos marinheiros”3, Vasco Moscoso de Aragão desembarcou e tem o bairro como cenário para toda narrativa trazida no livro (BARRETO, 2011). 

Em paralelo a função de veraneio, o bairro passou a exercer outras funções como o educacional, o médico, espaços de lazer, além da inserção de outros novos serviços, transformando-se em uma área de destaque no Subúrbio Ferroviário de Salvador (SILVA; FONSECA, 1992).

No final da década de 1950, o bairro teve o seu processo de ocupação ainda mais intensificado, isso se deu devido a construção de uma estrada, conhecida como Estrada da Base Naval, que ligava Periperi a rodovia federal BR-324. Tal mudança, somada a proximidade com a Fábrica de Cimento Aratu, e com a Petrobrás, localizadas nos bairros vizinhos, Paripe e Lobato, respectivamente, fizeram com que o bairro passasse a ser o endereço dos operários que trabalhavam nessas indústrias (SILVA; FONSECA, 1992).

Com um aumento populacional considerável e com os seus acessos facilitados através da finalização da estrada que ligaria o bairro à BR 324, ainda nesse mesmo período, Periperi passou a contar com sua primeira linha de ônibus, que possibilitou sua ligação com as demais áreas da cidade de Salvador. Tais mudanças contribuíram para que o bairro continuasse a atrair  novos moradores, principalmente aqueles que não conseguiam mais arcar com o custo de viver nos arredores do então centro4 de Salvador(SILVA; FONSECA, 1992).

A partir da década de 1970, com a inauguração da Avenida Afrânio Peixoto, também conhecida como Avenida Suburbana, que desempenha um papel fundamental no desenvolvimento não somente de Periperi, como de todo o Subúrbio, pois facilita os deslocamentos das pessoas e mercadorias e possibilita o surgimento de novos bens e serviços, o bairro continua a crescer rapidamente, aumentando as demandas por habitações (SILVA; FONSECA, 1992).

Como solução para suprir a necessidade de habitação popular no bairro, em 1972, é construído pela empresa Habitação e Urbanização da Bahia S.A., mais conhecida pela sigla URBIS5, o Conjunto Habitacional Dom Eugênio Sales, posteriormente, no final da década de 1970 e início da década de 1980, foram construídos pela mesma empresa os conjuntos habitacionais de Mirantes e Colinas de Periperi (SILVA; FONSECA, 1992; SOUZA, 2009). Esses conjuntos habitacionais contribuíram para que a Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU) aumentasse o número de viagens que ligavam o bairro às demais áreas da cidade (PINTO; SOUZA, 2018), consolidando-o como um dos dos bairros da capital que mais cresceram nessa época, indo de uma área destinada a veraneio para local de residências fixas (SANTOS, 2014).

Ainda em meados da década de 1970, após a instalação da Avenida Suburbana, o bairro continuou a apresentar um significativo crescimento, desde o econômico e social, até o cultural, isso porque se destacava com seus belos e tradicionais bailes de carnaval, que eram realizados nos clubes Flamenguinho e Esporte Clube Periperi6. Tais bailes competiam diretamente com os que eram realizados nos clubes mais famosos de Salvador, na época, entre eles o baile do Clube Bahiano de Tênis, no bairro da Graça, e o baile da Associação Atlética, no bairro da Barra (SOUZA, 2009).

Em 1980, consolidando o caráter cultural do bairro, moradores de Periperi fundaram o bloco afro Ara Ketu, nome de origem iorubá e que significa Povo de Ketu7, o grupo desfilou pela primeira vez na segunda-feira de carnaval daquele ano, trazendo fantasias inspiradas em trajes tradicionais africanos  e homenageou o rei caçador, Oxóssi, o orixá protetor do Ara Ketu (BARRETO, 2011). 

Nas décadas seguintes, o processo de ocupação do Subúrbio Ferroviário e, por conseguinte, de Periperi se caracteriza principalmente pelas ocupações informais, ocasionadas pela necessidade de moradias de pessoas vindas do interior da Bahia para a capital em busca de oportunidades. São exemplos: as ocupações em áreas livres dos loteamentos e dos conjuntos habitacionais, destacando a “invasão” de Nova Constituinte, em 1987 (SANTOS, 2014).

Com a consolidação dessa e demais “invasões” que foram ocorrendo, ao longo do tempo, acabaram resultando na formação de novos bairros e localidades nesta área, como exemplo os bairros de Vista Alegre, Fazenda Coutos, Ilha Amarela, Rio Sena, Alto de Terezinha, Alto do Cabrito, Jardim Lobato, Alto de Coutos, todos caracterizados principalmente pela ocupação espontânea e pela falta de infraestrutura (SANTOS, 2014). 

À medida em que as ocupações se expandiram, foram sendo instalados novos loteamentos regulares (ou não) na área de Periperi, que ampliaram os núcleos residenciais do bairro. Entretanto, essas novas áreas eram destituídas de saneamento e infraestrutura básica (REGIS, 2007). Dessa forma pode-se concluir que o poder público não acompanhou o processo de expansão urbana dessas novas áreas no bairro de Periperi (SANTOS, 2014). 

Até o final da década de 1980, o bairro de Periperi sofria com os constantes alagamentos que atingiam suas ruas, provocando diversos transtornos para o bairro, tais problemas eram causados principalmente devido aos avanços dessas ocupações informais sob o leito do rio Paraguari. O problema só veio a ser amenizado no início da década de 1990, quando ocorreu o processo de canalização do rio e a retirada das casas que se instalaram sobre ele. Ainda nos dias de hoje, 2021, o rio Paraguari continua apresentando sérios problemas, sendo o principal deles o lançamento de esgoto sem tratamento em suas águas, ocasionados, principalmente, pela alta densidade populacional da área do Subúrbio (SANTOS, 2014).  

A partir dos anos 2000, foram surgindo diversas manifestações culturais no bairro, como o Perifolia, Arrastão do Barão, além da Suburdança e da Parada LGBT de Periperi8 (SOUZA, 2009).

Atualmente, 2021, o bairro conta com uma vasta rede de comércio e serviços que atendem a população de Periperi, sendo considerado um dos bairros mais bem estruturados do Subúrbio Ferroviário. É possível encontrar ainda agências bancárias, supermercados, lojas de calçados e confecções e bares. O bairro conta também com uma unidade do Serviço de Atendimento ao Cidadão (SAC), localizado na rua Osvaldo Deway, além de uma feira livre que acontece na Rua Frederico Costa, onde comerciantes oferecem frutas, verduras, lanches dentre outros produtos (SOUZA, 2009). 

Quanto aos equipamentos de saúde, de acordo com as informações do Mapa da Saúde de Salvador, disponibilizado na aba de links deste site, o bairro conta com uma Unidade de Saúde da Família, localizada na Rua Direita da Constituinte, uma Unidade de Pronto Atendimento, na Rua Doutor Almeida, um Centro de Especialidades Odontológicas, também na Rua Doutor Almeida, além do Hospital do Subúrbio, localizado na Rua Manuel Lino. 

 

 

1 De acordo com Araújo (2005), inicialmente a concessão da ferrovia foi de Joaquim Francisco Alves Branco Luís Barreto (1853), posteriormente transferida à empresa britânica Bahia and San Francisco Railway Company (1855). Em 1901, o governo resgatou a linha férrea dos ingleses e a concedeu aos engenheiros Jerônimo Teixeira de Alencar Faria e Austriciliano de Carvalho, concedendo mais tarde a Teive Argolo e Cia, voltando, em 1909, às mãos dos sócios da Viação Geral da Bahia. Depois disso e, ao longo dos anos, a ferrovia foi administrada por diversas empresas privadas, quando em 1935 foi reestatizada e nomeada como Viação Férrea Federal Leste Brasileiro. Em 1957, foi criada a Rede Ferroviária Federal S.A. (RFFSA) que passou a administrar as linhas férreas da Bahia.

Assim como a ferrovia, a oficina também foi administrada por diversas empresas públicas e privadas ao longo de sua história. Sendo por fim, concedida à empresa RFFSA.

3 No livro, Jorge Amado narra as aventuras do comandante Vasco Moscoso de Aragão, a partir da sua chegada ao bairro de Periperi. A obra foi concluída no Rio de Janeiro e publicada em 1961.

4 O que se entende como centro da cidade varia conforme o momento histórico de ocupação e a forma expansão da cidade, neste sentido, o centro a que se refere Leite (2012) é aquele que abrange a área da rua Chile e parte do bairro do Comércio.

5 A Habitação e Urbanização da Bahia S.A. - URBIS, foi uma empresa de economia mista, constituída por tempo indeterminado. A empresa atuava principalmente na construção de habitação social e no desenvolvimento urbano do estado, sendo destituída em 1998, quando a responsabilidade pela construção dos conjuntos habitacionais e expansão urbana na Bahia foram transferidos para a Companhia de Desenvolvimento Urbano do Estado da Bahia - CONDER (MENDONÇA, 1989).

6 Nos dias de hoje, 2021, os clubes ainda encontram-se em funcionamento, sendo usados principalmente como clubes esportivos e locais de eventos, entretanto, não possuem mais tanto destaque como no passado.

7 De acordo com Velame (2007), as nações de candomblé da Bahia são definidas através de um padrão ideológico baseado em tradições religiosas e rituais com origens diversas em todo o continente africano. Sendo Ketu, uma das principais nações básicas do candomblé na Bahia.

Os eventos são organizados pelos próprios moradores do bairro e ocorrem ao longo do ano na Praça da Revolução, principal local público de lazer de Periperi. Sendo a Perifolia uma festa de micareta que ocorre no mês de fevereiro antes ou após o Carnaval, o Arrastão do Barrão por sua vez, corresponde a uma festa junina que ocorre no mês de junho. As demais festas, como a Suburdança e a Parada LGBT de Periperi, não possuem datas fixas (SOUZA, 2009). 

 

 

REFERÊNCIAS:

ARAÚJO, Mayara Mychella Sena. A ferrovia e a configuração urbana da cidade de Alagoinhas-Bahia. Trabalho de Conclusão de Curso de Gradução em Urbanismo -Universidade do Estado da Bahia, Departamento de Ciências Exatas e da Terra, Salvador, 2005.

BARRETO, Natan. Entre mangueiras: a vida de Eunice Palma. Simões Filho: Kalango, 2011.

MAURÍCIO, Edmara Matos. Patrimônio local de Paripe: propostas de ações educativas em sala de aula. Trabalho de Conclusão de Curso de graduação.  Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal da Bahia. Salvador, 2018.

MENDONÇA, Frederico. A estratégia de localização dos conjuntos habitacionais da URBIS em Salvador, entre 1964 e 1984. Rua, Salvador, v.2, n.2, p. 61-83, 1989. 

PINTO, Jeremias Pereira; SOUZA, Tatiana Araújo de. Transformações socioespaciais de Salvador e a formação do Subúrbio Ferroviário. 21ª Semana de Mobilização Científica - SEMOC. Anais…, Salvador, 22 a 26 de outubro de 2018

REGIS, Imaira Santos Rita. Lobato e Paripe no contexto da Avenida Suburbana: uma análise sócio-espacial, 141f. Dissertação (Mestrado). Programa de Pós-Graduação em Geografia. Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2007.

ROSSI, Rinaldo C. Da fazenda ao loteamento fortificado da Sapoca: a urbanização na orla de Tubarão (Salvador-BA). Monografia – Universidade Federal da Bahia. Instituto de Geociências, 2015.

SANTOS, Nilton Magalhães. O saneamento e a questão social em Periperi (Salvador/BA): um olhar sob o enfoque da drenagem urbana – 1989 a 2013. Salvador 2014

SANTOS, Elisabete et al. O caminho das águas: bacias hidrográficas, bairros e fontes. Salvador, 2010. 

SILVA, Sylvio Carlos Bandeira de Mello; FONSECA, Antonio Angelo Martins da. A produção do subúrbio ferroviário de Salvador: os exemplos de Paripe e Periperi. Veracidade, Salvador-BA, v. 2, n. 4, p. 67-80, 1992.

SOUZA, Flávia Silva de. Formação e consolidação de centralidades lúdicas no cotidiano das áreas populares de Salvador-Ba. Mestrado (Dissertação) - Universidade Federal da Bahia - Instituto de Geociências. Salvador, 2009. 

VELAME, Fábio Macêdo. A arquitetura do terreiro de candomblé de culto aos Egum: O Omo Ilê Aboulá, 501f. Mestrado (Dissertação) - Universidade Federal da Bahia. Programa de Pós Graduação em arquitetura e urbanismo. Salvador, 2007.  

 

 

SOBRE O AUTOR E A AUTORA:

*Jonas Oliveira Santana é graduando em Arquitetura e Urbanismo pela Faculdade de Arquitetura da UFBA, bolsista do observaSSA, com financiamento da Pró-Reitoria de Ações Afirmativas - PROAE. 

**Mayara Mychella Sena Araújo é Doutora e Mestre em Geografia pela Universidade Federal da Bahia (UFBA). Bacharela em Urbanismo pela Universidade do Estado da Bahia (UNEB). Atualmente é Professora Adjunta da Faculdade de Arquitetura da UFBA e coordenadora do observaSSA. 

 

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